28.2.06

Notícia do Brasil


Em época carnavalesca achei que devia repartir com vocês este capítulo de "Notícia do Brasil" apresentado em 1587 em Madrid por Gabriel Soares de Souza a Cristovão de Moura, secretário de Filipe I de Portugal, II de Espanha.


CAPÍTULO CLVI
Que trata da luxúria destes bárbaros


São os tupinambás tão luxuriantes que não há pecado de luxúria que não cometam, os quais sendo de muito pouca idade têm conta com mulheres e bem mulheres, porque as velhas já desestimadas dos que são homens, granjeiam estes meninos fazendo-lhes mimos e regalos, ensinam-lhe a fazer o que eles não sabem e não os deixam nem de dia nem de noite. É este gentio tão luxurioso que poucas vezes tem respeito às irmãs e tias e porque este pecado é contra seus costumes, dormem com elas pêlos matos e alguns com suas próprias filhas e não se contentam com uma mulher, como já fica dito, pelo que morrem muito de esfalfados. E em conversação não sabem falar senão nestas sujidades que cometem cada hora, os quais são tão amigos de carne que se não contentam para seguirem seus apetites com o membro genital como a natureza formou, mas há muitos que lhe costu­mam pôr o pêlo de um bicho tão peçonhento que lho faz logo inchar, com o que tem grandes dores mais de seis meses, que se lhe vão gastando por espaço de tempo, com o que lhe faz o seu cano tão disforme de grosso que os não podem as mulheres esperar nem sofrer; e não contentes estes selvagens de andarem tão encarniçados neste pecado naturalmente come­tido, são mui afeiçoados ao pecado nefando, entre os quais se não tem por afronta e o que serve de macho se tem por valente e contam esta bestiali­dade por proeza e nas suas aldeias pelo sertão há alguns que têm tenda pública a quantos os querem como mulheres públicas.

Como os pais e as mães vêem os filhos com manejos para conhecerem mulher, eles lha buscam e os ensinam como a saberão servir; as fêmeas muito meninas esperam o macho, maiormente as que vivem entre os por­tugueses. Os machos destes tupinambás não são ciosos e ainda que achem outrem com as mulheres, não matam a ninguém por isso, quando muito espancam as mulheres pelo caso. E as que querem bem aos maridos, para os contentarem buscam-lhe moças com que eles se desenfadem, as quais levam à rede onde dormem e lhe pedem muito que se queira deitar com o marido e as peitam para isso, coisa que não faz nenhuma nação de gente senão estes bárbaros.